Hoje em dia, parece que a maioria das pessoas tem muitas coisas para resolver. Todos reclamam de se sentirem sobrecarregados. Então, como explicar a seu chefe que você simplesmente tem trabalho demais para fazer? Ninguém quer parecer preguiçoso, desleixado ou individualista. Como você pode proteger sua imagem de funcionário esforçado e ao mesmo tempo bater no tatame?

O que os especialistas dizem

Por mais ocupado que você esteja, pode ser muito difícil conversar com o seu chefe sobre sua pesada carga de trabalho. Há duas razões para isso, de acordo com Julie Morgenstern, especialista em produtividade e autora de Never check e-mail in the morning. Primeiro, você não quer perder o emprego. “No seu âmago há uma sensação de que se você disser que não consegue fazer tudo, existe quem consiga; você se sente dispensável”, diz ela. Em segundo lugar, “A tendência natural é pensar, ‘Eu não estou trabalhando duro, ou sendo suficientemente eficiente. Eu deveria ser capaz de lidar com isso.’ Então você sofre em silêncio.”

Mas esse caminho é perigoso para a sua carreira, diz Liane Davey, cofundadora da 3Coze Inc. e autora de You First: Inspire Your Team to Grow Up, Get Along, and Get Stuff Done. “Você se compromete demais porque é ambicioso, ou quer agradar a seu chefe, mas quando fracassa em mostrar serviço — ou entrega um trabalho feito às pressas ou de má qualidade — isso comunica que você não é confiável. ” Assim, quando estiver sobrecarregado, fale com seu supervisor. Aqui estão algumas maneiras de tornar essa conversa mais suave:

Permita-se

Sentir-se sufocado e sobrecarregado não significa que você é um funcionário abaixo da média. “Não se julgue tanto”, diz Morgenstern. “A maioria das organizações está tentando cumprir mais com menos, então há mais trabalho a ser feito do que tempo para executá-lo. ” Se você tem bom desempenho, mas ocasionalmente recusa um pedido ou pede um prazo maior, “você não está sendo preguiçoso, e isso não reflete negativamente em você”. Na verdade, acrescenta, dizer não de vez em quando aumenta a sua credibilidade. “Os chefes querem que seus funcionários falem a verdade, caso algo os impeça de desempenhar bem seu trabalho.” Mesmo sendo desconfortável admitir que você não consegue lidar com tudo que lhe foi delegado, Davey afirma que é “a coisa responsável a fazer” pela empresa. “Se você está sobrecarregado e não pode levar seus compromissos a cabo, não deixa a equipe no escuro.”

Busque conselho e apoio

Quando se sentir ocupado demais, pode ajudar ouvir a perspectiva de um outsider, diz Morgenstern. “Um terceiro pode ajudar você a pôr os pés no chão.” Ela recomenda detalhar seus projetos e obrigações a um amigo de confiança ou um colega. “Peça a ela/ele analisar a quantidade de trabalho que você tem” e dar uma opinião honesta “sobre se é demais para uma pessoa só”. Você também pode pedir a seu chefe conselhos e “orientações para lidar com muitas tarefas”, diz Davey. Pedir ajuda auxilia ambas as partes a esclarecer as expectativas e trabalhar com mais eficácia. “Digamos que você leve cinco horas por mês para preparar um relatório para o departamento financeiro. Isso está alinhado com o que você esperaria? Você tem alguma sugestão para agilizar o processo?” Afinal, “não é como se o seu chefe nunca tivesse se sentido assim antes.”

 Ofereça soluções

Ter uma conversa honesta com seu gestor sobre sua carga de trabalho requer a mentalidade correta, afirma Morgenstern. “Você está se unindo a seu chefe para cumprir os objetivos da empresa.” Ela sugere começar a conversa “relembrando os objetivos compartilhados pela organização” para garantir que vocês dois estejam em sintonia. “Depois, diga o que está atrapalhando”. Seja o mais específico possível. Você pode dizer, por exemplo, “essa tarefa requer muita pesquisa, o que consome tempo”, ou “agora que estou gerindo uma equipe, gasto mais tempo planejando, e tenho menos tempo para o trabalho cotidiano.” A próxima parte da conversa é essencial: ofereça três ideias para resolver a questão. “Nunca vá a seu chefe com um problema a menos que tenha a solução”, diz Morgenstern. Você pode, por exemplo, sugerir que certas tarefas sejam feitas a cada trimestre (e não a cada mês), ou que seus colegas o ajudem com um projeto específico, ou que a organização contrate um funcionário temporário para suavizar a carga. O seu objetivo é identificar os “projetos que possam ser adiados, delegados, deletados ou diminuídos.”

 Estabeleça prioridades

É desgastante quando o seu chefe dá mais um afazer e você já está atolado. “Frequentemente eles passam tarefas sem a menor ideia de quanto tempo demandam para serem feitas”, diz Davey. Você deve responder explicando as suas responsabilidades e depois perguntando, “Qual dessas é a mais crítica? E como você priorizaria o restante?” Morgenstern recomenda pedir para seu chefe “definir o nível de esforço” que ele espera em certas tarefas e “qual é a aparência de um nível máximo, mínimo e moderado de esforço.” Seja o que for, não concorde imediatamente com nada que você não tenha certeza de que pode cumprir, diz Morgenstern. “Fale, ‘Me diga o que é esperado que eu faça com isso, e me deixe descobrir se posso fazê-lo com base nos outros projetos em que estou trabalhando. Posso responder amanhã?’ Ganhe tempo.”

Ofereça ajuda

Mesmo quando você já tem muito a fazer, ajudar como pode é algo prestativo e profissionalmente inteligente. A mensagem para seu chefe, diz Davey, deve ser algo como “Não sinto que posso participar [desse projeto] sem fazer um desserviço ao outro trabalho com o qual me comprometi, mas posso abrir espaço na minha agenda para orientar a outra pessoa que vai se encarregar disso. ” Você pode, por exemplo, se oferecer para fazer parte das sessões de brainstorming, ler os rascunhos, ou dar conselhos. “Mostre disponibilidade”, diz ela. Oferecer um pequeno cronograma — mesmo quando a sua agenda está cheia — é uma forma de consolidar “a sua identidade como funcionário responsável e comprometido com o sucesso da organização”, diz Morgenstern.

Seja honesto

Há períodos na vida nos quais eventos pessoais tumultuosos tomam o lugar de todo o resto. Se você está experimentando um desses períodos — a sua mãe foi diagnosticada com uma doença séria, ou seu filho está com dificuldades na escola — é melhor ser direto, diz Morgenstern. Você pode dizer ao chefe, “Se eu ignorar isso, haverá um estresse enorme na minha família e isso afetará o meu desempenho no trabalho”, ela diz. O seu tom deve ser direto, e o seu comportamento deve ser “tão realista e centrado quanto o possível”. Davey concorda: “Dê a entender que é uma condição temporária, situacional”.

“Diga, ‘Isso não acontece com frequência, mas as próximas duas semanas são um pouco turbulentas para mim. Preciso de ajuda.’” Um chefe bom e razoável entenderá e será grato pela sua honestidade. “Bancar o herói até um ponto de desgaste total não é a melhor resposta.”

Mantenha seus colegas próximos

Contar a seu supervisor que você está sobrecarregado nem sempre produz o efeito desejado. Quando o chefe não está inclinado a mudar, Davey recomenda dar um alerta a seus colegas que você está se sentindo abarrotado. “Se seu chefe não der um descanso a você, eles podem ajudar”, afirma. Talvez eles possam cuidar de algo no seu lugar, ou combinar a extensão de um prazo. “Mesmo se não puderem ajudar, eles ao menos terão sido avisados” que você está onerado e incapaz de dar o seu melhor, e que você “se afastou de tudo que possa abalar a confiança deles”. Se o seu chefe é continuamente insensível ao seu nível de ocupação, considere isso como um sinal de que você pode procurar um novo emprego, diz Morgenstern. A sobrecarga “não é sustentável” a longo prazo, diz.

Princípios a lembrar

Faça:

Não faça:


Estudo de caso #1: ofereça soluções e esteja aberto a sugestões

Um ano após se tornar vice-presidente de estratégia de produtos na Ceridian, Lisa Sterling também foi promovida a CPO da empresa, que produz softwares de recursos humanos e está localizada em Minneapolis. À época, seu plano era fazer os dois trabalhos ao mesmo tempo.

Mas poucos meses depois, Lisa estava pasma com a carga de trabalho. Ela sabia que precisava falar com seu chefe, David Ossip, CEO da Ceridian, mas estava nervosa. “Eu nunca tinha pedido ajuda a um superior antes”, explica. “Nós trabalhávamos bem juntos, mas eu tinha esse medo de que ele repensaria a sua decisão [de me promover] e sentir que eu não estava à altura do cargo.”

Lisa iniciou a conversa afirmando quais eram as prioridades da empresa, a seu ver. Ela queria deixar claro que estava focada. Em seguida, ela apresentou uma lista completa dos diferentes projetos nos quais havia se envolvido, tanto nos produtos, como no RH. “Então eu dividi com ele os pontos em que estava progredindo e os que estava tendo dificuldades”, diz.

Por fim, Lisa ofereceu algumas soluções possíveis. “Esse é o conselho que dou à minha equipe; ‘se você me vem com um problema, coloque-se no meu lugar e pense em como o resolveria.’”

Nesse caso, Lisa sugeriu iniciativas organizacionais específicas que poderiam ser passadas ao segundo plano e certos lançamentos de produtos que poderiam ser adiados temporariamente. Outra ideia foi contratar um diretor de estratégia de produtos que poderia se encarregar de parte de suas responsabilidades.

Seu chefe gostou de ambas as recomendações. Ele também a deu orientações sobre liderança. “Ele me disse que, conforme eu avanço na minha carreira, meu trabalho é mais sobre desenvolver a minha equipe e menos sobre manutenção cotidiana”, conta. “Percebi que eu estava envolvida em coisas demais. Precisava melhorar minhas capacidades de delegação de tarefas e deixar a equipe fazer seu trabalho. ”

Lisa está satisfeita por ter aberto o jogo. “Foi revelador para mim”, diz. “Se eu não tivesse pedido ajuda, nunca teria recebido esse coaching.”

 

Estudo de caso #2: Seja honesto e direto — e prepare-se para quando o seu chefe recusar a negociar

Há vários anos, Janine Truitt trabalhava como associada de RH em um grande sistema hospitalar. A organização, com sede em Long Island, Nova York, estava expandindo rapidamente seu número de funcionários, e o departamento de RH mal podia acompanhar esse passo.

“Eu era responsável por posições que iam das iniciantes às executivas em mais de 10 unidades”, Janine rememora. “Minha chefe também me designou para projeto especiais e forças-tarefa para o planejamento da expansão dos hospitais. ”

Após trabalhar na área da saúde por quase uma década, ela atingira um ponto crítico. Mas antes de se dirigir à sua chefe, foi falar com seus colegas mais próximos sobre sua carga de trabalho. “Falar com eles foi mais pelo apoio moral do que para pedir concordância sobre se eram coisas demais, diz. “Cada um de meus colegas estava carregando muito menos do que eu, e eles sentiam pena de mim.”

Ela chamou sua diretora para discutir o assunto e foi franca e direta na conversa. “Eu disse a ela que não considerava aquela carga sustentável”, conta. “Nunca me preocupei com as consequências de me abrir, mas estava apreensiva sobre desapontar meus colegas, ou mesmo os pacientes.”

Janine sugeriu diversas maneiras de melhorar a situação. Por exemplo, sugeriu que um funcionário júnior cuidasse das contratações de iniciantes, o que a deixaria mais livre para focar nas posições estratégicas. Ela também pediu para ser incluída nas conversas relativas ao projeto de expansão com mais antecedência. “Dessa maneira, eu poderia estar a par das necessidades e estar  mais apta a preencher as futuras vagas.”

Infelizmente, sua chefe não estava aberta a nenhuma de suas ideias. Janine se viu frustrada e mais uma vez se abriu com seus colegas: “Nós nos unimos quando haviam posições parecidas a serem preenchidas na mesma unidade. Isso ajudou a aliviar um pouco do peso.”

Ainda assim, Janine conta que a sobrecarga persistiu até que entregou seu pedido de demissão. Hoje ela é CIO na Talent Think Innovations, empresa de estratégia e consultoria.

Ela não recorda de seu emprego anterior com carinho, mas aprendeu uma lição valiosa. “Planejar a força de trabalho é uma das considerações mais importantes a se fazer para montar um negócio eficiente”, diz. “Se você quer reter seus clientes e funcionários, deve ter certeza de que seus empregados não estão constantemente estressados além do razoável.”

Rebecca Knight é jornalista freelancer em Boston e palestrante na Wesleyan University. Seu trabalho já foi publicado no New York Times, USA Today e no Financial Times. Artigo publicado na Harvard Business Review Brasil.